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Os Setênios segundo a Antroposofia

A Antroposofia é o conhecimento da natureza do ser humano e do universo, que abrange muitas áreas do conhecimento, tais como Medicina, Pedagogia, Agricultura, Nutrição, Artes, Farmacologia e Psicologia, entre outras.

Ela baseia-se na tradição cristã ocidental, na Fenomenologia e nas ciências para a compreensão do ser humano, e por seu método, chega ao fato de que o universo não é constituído apenas de matéria e energia, apontando para um mundo espiritual não físico que compõe a vida.

Desenvolvida pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), pode ser compreendida inicialmente através da visão de homem que baseia-se na existência de:

· um mundo Espiritual, o “Eu”, ou ainda a Essência Divina;

· um mundo físico, o corpo, a hereditariedade, a matéria;

· e a alma, a conexão entre os mundos espiritual e físico no presente, a vivência.

A união desses três aspectos forma a visão de Homem para a Antroposofia.

A Trimembração pode ser vista no físico, na divisão do corpo em Sistema Neurossensorial (essencialmente o cérebro), Sistema Rítmico (basicamente pulmão e coração) e o Sistema Metabólico Motor (que inclui os membros, músculos e intestinos).

Embora existam outros “números mágicos” na Antroposofia, para efeito didático utilizarei a trimembração para a compreensão básica de que o ser humano não é apenas esse corpo que vemos, mas reúne a essência espiritual e a vitalidade, e farei uma ponte direta com os setênios para falar do desenvolvimento humano.

Na Medicina, Psicologia e Pedagogia Antroposóficas entendemos que a vida de uma pessoa pode ser compreendida através do cenário e das mudanças que ocorrem a cada sete anos – os setênios.

Os primeiros três setênios da vida de uma pessoa se relacionam diretamente ao desenvolvimento do corpo físico essencialmente. É o “momento de chegada” do ser espiritual, que já existe independentemente da matéria, nesse corpo físico, e sua ligação que se dá através da alma, que anima o corpo, dá a vida.

O foco é no corpo, o espírito vai aos poucos se desconectando do plano espiritual e vai se individualizando, se materializando para a experiência dessa biografia diurna, (como chamamos a vida encarnada na Antroposofia).

São polaridades acontecendo simultaneamente: o corpo físico se formando, endurecendo, ficando ágil e independente, enquanto o espírito vai se desconectando do plano astral e se atendo à matéria.

Assim, vemos um bebê recém nascido, sem muito domínio do próprio corpinho, ainda frágil e molinho, totalmente dependente da mãe, muitas vezes com uma forte presença, ou até dizemos “um olhar sábio ou profundo”...

Primeiro Setênio - 0 a 7 anos

De 0 a 3 anos a criança irá dominar o Sistema Neurossensorial; enquanto começa a controlar o corpo – levanta o pescoço, senta, engatinha, anda (domínio da postura ereta). Começa a falar, iniciando pelo nomear, depois adjetivar e por fim dominar a ação (verbo). Por último vem a consciência do “Eu”, deixando de se referir a si mesmo como “neném” e passando a compreensão do “Eu” x “Outro”, ao mesmo tempo em que consegue controlar os esfíncteres.

Entre 3 e 5 anos inicia o trocar, o compartilhar, o brincar social e a fantasia. Nasce a curiosidade, a criatividade e vontade. Aos 3 anos inclusive acontece a primeira crise de identidade, a temida e famosa “birra”, que é a manifestação da vontade própria. É o momento em que o pequenos não querem colocar roupa, ou dormir ou comer na hora certa, quando se jogam no chão e choram sem derramar lágrimas, apenas porque “podem”.

A sexualidade aqui tem a ver com a descoberta, a curiosidade, e não com a sensualidade ou desejo.

Entre 5 e 7 anos o domínio do próprio corpo é bem maior. A criança corre, pula, sobe e desce, anda de bicicleta, a cavalo, domina o equilíbrio motor e começa a desenvolver a coordenação motora fina, ao mesmo tempo que as se desenvolvem as representações mentais no campo da memória. Daí a Pedagogia Waldorf entender que é neste momento que se deve dar início ao aprendizado formal.

É durante esse setênio que se desenvolve essencialmente os sentidos do Tato (inclusive a fase de colocar tudo na boca não tem a ver com sabor, e sim com texturas – tato), o sentido Vital (autopercepção) e de movimento e equilíbrio. Nesse momento aprendemos sobre afeto, segurança, autoconfiança e captamos a noção de tempo/espaço.

Esta é a fase de crescimento mais acelerado, de conquistas físicas e mentais mais acentuadas. O acontecimento físico que marca o fim dessa fase é a queda dos dentes de leite (por isso não é um número exato, há crianças que perdem os dentes aos 6, outras com quase 8 anos de idade).

Segundo Setênio – 7 a 14 anos

O segundo setênio é a fase dos 7 aos 14 anos. Fase escolar, de intenso aprendizado formal e social. É a fase onde começamos a nos desligar dos pais e dar valor aos amigos.

Entre 7 e 9 anos as polaridades afloram: meninos x meninas, gosto x detesto, fácil x difícil... A segunda crise de identidade que vivemos acontece por volta dos 9 anos, e é chamada de Rubicão, em referência histórica à travessia do Rio Rubicão, na Roma Antiga, feita por Julio Cesar para conquistar o Império Romano, ou seja, decisão difícil, arriscada, pensar grande, caminho difícil e potencialmente perigoso...

Essa fase marca o fim da infância e um recomeço. As descobertas de que “Papail Noel não existe”, os Vingadores são apenas atores fantasiados, entre outras, colocam em cheque o mundo como a criança o conheceu até hoje. Isso por si só é um grande acontecimento, e gera medo, insegurança, irritação, frustração, e abre caminho para agressividade, confrontamento, mentiras e solidão. Existe um sentimento de não ser querido, é a fase em que “a professora implica comigo”, “ninguém gosta de mim”, “meus amigos brigaram comigo”. Os meninos podem partir para a violência física, enquanto que as meninas normalmente tendem para a violência psicológica – as intrigas, fofocas e assédio moral entre as colegas é fulminante.

É um momento em que os adultos devem acolher “também já me senti assim”, ajudar a nomear os sentimentos (conhecer) e valorizar a verdade, dando exemplo.

De 9 a 12 anos é a principal fase de formação de valores e hábitos. Regras, limites e consequências são importantes porque ajudam a delinear a vida. Por isso é tão importante que as crianças nessa fase possam participar da rotina da casa, ter suas tarefas, sentirem-se pertencentes e ativos como membros da família, pois assim entendem sobre responsabilidades, colaboração, empatia, frustração e limites.

A consciência está mais presente, portanto, noções de realidade, hierarquia e classificação precisam ser coerentes e constantes. No crescimento físico, nota-se a mudança das feições (com a perda das formas mais arredondadas de rosto e mãos, como de bebês, para as formas mais adultas) e um alongamento das pernas, dando a mobilidade necessária para “correr o mundo”. No âmbito social existe primeiro uma noção de ser humano (até os 11 anos) e depois a separação entre Homem e Mulher e suas diferenças mais gritantes e identificação com um ou outro.

Entre 12 e 14 anos, a Puberdade, é o momento em que o “Eu” está ainda mais presente, e por isso, transgredir, argumentar e “bater boca” fica ainda mais forte.

O final desse setênio é marcado pelas mudanças físicas e hormonais – crescimento de pelos, menstruação (início ou regularização), alteração na voz dos meninos, as formas mais femininas nas meninas.

Terceiro Setênio – 14 a 21 anos

Numa primeira fase, uma busca pela nova imagem “Quem sou eu”, que muitas vezes espelha a imagem de um grupo e não mais a de familiares. É um momento de transgressão de regras, questionamento constante e dificuldades de adaptação.

Depois, chega um momento de busca de ideais – espiritualidade, política, ídolos, estilo de vida - e um constante e intenso olhar sobre sentimentos e relações. A curiosidade, modelos adotados e a necessidade de transgressão podem levar ao mundo das drogas e atos ilícitos.

Na última fase do setênio já acontece uma preparação para a vida adulta, acontece por volta dos 18 anos a terceira crise de identidade, que culmina com a escolha profissional em muitos casos.

Esta é a fase da adolescência para a Antroposofia – momento de muitos questionamentos, dúvidas, busca pelos ideais, busca pela aprovação do grupo, transgressão, decepções, intensidade de sentimentos, e também definições e muitas novas experiências.

Os próximos 3 setênios são relacionados ao desenvolvimento da Alma:

Quarto Setênio – 21 a 28 anos

Conhecido como Alma da Sensação, é o momento de Vivenciar o Mundo. Existe um predomínio das sensações, uma fase de aventuras, de arriscar, de viver intensamente. Uma fase de dissociação dos pais. Nesse momento muitos jovens saem de casa, viajam o mundo, arrumam empregos, escolhem viver em comunidades, etc.

Pode persistir a necessidade de aprovação, mas direcionada a outras esferas, como na carreira, por exemplo.

Concretização dos idealismos do setênio anterior, desenvolvimento de capacidades e habilidades técnicas marcam esse setênio. O jovem começa a assumir a responsabilidade pela própria vida.

Aos 28 anos acontece a Crise dos Talentos – “que caminho é esse que estou seguindo?” – por isso é o momento de consolidação ou mudanças profissionais e pessoais.

O quarto setênio espelha o setênio anterior, quase dá continuidade às mesmas questões, talvez apenas com um pouco a mais de consciência do “Eu”.

Esta fase é marcada por um grande entusiasmo de desbravar o mundo, uma sexualização da vida - “tesão pela vida”, “tesão pelo trabalho”, “tesão por viajar” e também pelo “desprazer” de outras coisas – “ter que” conviver com a família, aguentar aquele chefe, não gostar do trabalho que escolheu...

Quinto Setênio – 28 a 35 anos

“Alma da Compreensão” – momento de conquistar o meu lugar, momento de integrar razão e coração, integração do feminino e masculino, ampliação da compreensão do outro e de compartilhar.

Durante os Anos Crísticos acontecem definições importantes, reflexões sobre a vida, crescimento na carreira, definições na vida pessoal... Estamos no auge da vitalidade e do corpo físico.

Aos 33 anos pode iniciar ou alcançar uma iluminação na Busca Espiritual – inicia a compreensão de que algo tem que morrer para uma nova força surgir.

O risco aqui é o excesso de atividades e a rotina excessivamente cheia fazer abandonar a busca de ideais do setênio anterior. Pode haver um foco exagerado na carreira causando um desequilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Podem também aparecer doenças físicas e psicológicas, como depressão, síndrome do pânico e Burn Out, entre outras.

O desafio nesse momento é tolerar. Aceitar opiniões diferentes, criar espaços para diálogos, praticar empatia.

Espelha o segundo setênio, o que pode colocar em jogo Família x Carreira, e também questões éticas.

As marcas desse setênio são a forma como eu organizo – minha vida, minha carreira, minha casa, minhas ideias...

Sexto setênio – 35 a 42 anos

“Alma da Consciência” , momento em que eu consolido o lugar que ocupo no mundo.

Durante essa fase a relação entre Ser e Ter é colocada à prova e ajuda a definir quem eu sou no mundo.

Começa o declínio físico. Acontece a Crise de Autenticidade (pode acontecer durante todo este setênio) – Quais são os meus limites? Eu os aceito? O que eu fiz até agora que me representa? Quem sou eu? Quem eu quero ser?

Se acirram os questionamentos sobre propósito de vida, significado de estar vivo, qual minha obra na Terra...

A autocrítica é exacerbada, e a auto aceitação é base para aceitação do outro e empatia. Pode acontecer o desenvolvimento de habilidades sociais.

O risco aqui é afundar-se ainda mais na rotina e não se questionar. Valorizar o Ter e se afundar ainda mais na carreira. Nesse momento mudanças radicais, demissões, doenças, mortes, separações podem ser um começo de uma grande reviravolta.

O espelhamento do primeiro setênio aqui está ligado ao desenvolvimento do autocontrole e do olhar para a família e a moral. Pode haver nesse momento um grande vazio, uma incompreensão de si ou de outros, e dessa crise pode advir a consciência plena e a liberdade interior.

Quando não há a aceitação do envelhecimento e de sua posição, pode acontecer a competição e não aceitação dos mais jovens – no âmbito profissional ou mesmo no pessoal (brigas com filhos adolescentes, ou confrontamento com trainees e estagiários, por exemplo).

*Alguns estudos Antroposóficos apontam que a humanidade está passando pela Alma da Consciência nesse momento.

Os próximos 3 setênios são chamados Anos de Atingir a Sabedoria, ou de Realização da Vida.

Sétimo Setênio – 42 a 49 anos

“Alma da Imaginação”, setênio de crise existencial, que pode se refletir em uma sensação de vazio, ou intensificação do questionamento “O que estou fazendo da minha vida?”.

Momento de enxergar sombras – minhas e dos outros. Momento de quebrar simbioses e assumir a responsabilidade pela própria vida. Aprender a lidar com o mundo interno.

Espelha o terceiro setênio, o que inspira um retorno à adolescência, algumas vezes refletido no desejo de jovialidade, conhecido como “Segunda Adolescência”, quando algumas pessoas podem iniciar ou intensificar um culto ao corpo, arrumar um amante, comprar um carro esporte caríssimo, exagerar na bebida... Por outro lado, quando há entendimento e aceitação do momento, pode acontecer um “acender da luz própria”, e um encontro com o propósito pessoal. Isso ocorre também pela intersecção da curva biológica (em declínio) e a curva anímica, que pode acompanhar a curva biológica ou em oposição, ampliar a consciência espiritual.

É normalmente um setênio marcado por grandes mudanças, novos começos e até inversão de valores (divorciar-se, casar novamente, trocar de carreira, virar vegetariano, mudar de religião, etc).

Oitavo setênio – 49 a 56 anos

Alma Inspirativa, ou Fase da Sabedoria, esse setênio é definido pela redefinição de ritmo, um novo olhar e novos valores.

Ter consciência do próprio ritmo é fundamental para evoluir, caso contrário o coração e pulmão se ressentem – podem aparecer ou ressurgir doenças respiratórias ou cardíacas.

Aprender a ouvir e obedecer os próprios sentidos e a voz interna, desenvolver a paciência e uma atitude mais contemplativa perante a vida é o grande diferencial nessa fase.

O terceiro nó lunar acontece entre 55 e 56 anos. Há uma nova crise e se há aceitação da própria realidade e consciência, pode haver uma impulsão para grandes obras. Artistas, escritores, políticos, juristas de renome atingiram sucesso nessa fase.

É preciso colocar energia no que realmente importa e para isso saber escolher é fundamental, bem como saber dizer não.

É normalmente a fase em que a mulher atinge a menopausa, e o homem a andropausa, mudando a relação hormonal no corpo físico, com impacto no psiquismo.

Nono setênio - 56 a 63 anos

Alma Intuitiva ou Fase mística – “Tenho uma nova Missão”.

O declínio físico representa a liberação das forças do sistema neurossensorial e a expressão disso são as escleroses. É um momento de reavaliação:

Como foi minha vida? O que alcancei e o que deixei de alcançar? O que ainda gostaria de desenvolver?

É o espelhamento do quarto setênio – ir para o mundo, buscar novas sensações, respeitando os limites do corpo – e do primeiro setênio – colocar a própria bondade no mundo.

A partir dos 63 anos, temos a fase de interiorização da Vida. Setênios onde as leis biográficas não mais se aplicam, e, portanto, temos muito mais liberdade em conduzir nossas vidas de acordo com a trajetória que fomos desenvolvendo ao longo dos setênios anteriores. É uma fase normalmente de sabedoria, mas de cada vez menos desenvoltura do ponto de vista físico e conexão maior com a espiritualidade (para quem fez essa escolha durante a crise de autenticidade).

Durante toda nossa biografia diurna as crises têm um papel fundamental no desenvolvimento humano. As crises representam a morte para o renascer, a poda das árvores. Elas são naturais e fazem parte das leis biográficas. Evitá-las apenas adia seu surgimento e consequências. Estar consciente, acolher as dores e delícias desse momento, por outro lado, faz com que consigamos perpassar o momento e aprender com ele.

Estar atento a si, conhecer a própria história, compreender os momentos de crise e o ritmo da vida faz com que nossa trajetória fique mais leve e traz luz ao propósito. O trabalho biográfico é um processo de intenso aprendizado sobre si e sobre os que nos cercam, e contribui para a saúde emocional e até mesmo à física. Busque um profissional preparado para ancorar esse processo e vá fundo!

Um abraço com carinho!

Raquel Sarmento

Psicóloga Antroposófica

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