Dois Lobos
- raquelmsarmento
- 15 de jul. de 2014
- 4 min de leitura
Diz um provérbio dos índios norte-americanos que temos dois lobos dentro de nós, um bom e outro mau, que estão constantemente a brigar. E vencerá aquele que for mais alimentado.
Esta sabedoria simples e milenar, está cheia de conteúdo ligado à alma humana, espiritualidade, ao perdão mas também à inteligência emocional e ao autodesenvolvimento...
Aos poucos torna-se cada vez mais conhecido e corriqueiro que temos dentro de nós mesmos as respostas que precisamos para nossas vidas, independentemente do âmbito pessoal ou profissional.
A forma como pensamos e como nos comportamos é reflexo direto daquilo que aprendemos como correto, que repetimos inúmeras vezes, ou, se preferir, que sabemos instintivamente. Agimos como achamos mais fácil, mais cômodo, como estamos habituados, ainda que a situação peça outra atitude. E colocamos a culpa no outro, na sociedade, na empresa, no chefe, mas com certeza, se pararmos para avaliar, vamos perceber que aquilo que pensamos e a forma como agimos não é de mais ninguém, senão de nós mesmos.
Ainda que o ambiente me leve a tomar uma atitude, eu tenho escolha para determinar o caminho. Sou eu quem decido qual o lobo que vou alimentar.
Podemos identificar ao nosso redor pessoas que reagem de maneiras muito distintas a situações similares. Por que isso acontece? Porque a pessoa escolhe o caminho. Alguns naturalmente escolhem o caminho do bem, da paz, da mansuetude, e outros, com a mesma naturalidade, escolhem a agressividade, a briga, a paixão. As escolhas sempre estão embasadas na personalidade, no ambiente, nos valores, e outros elementos fundamentais que compõem a vida de uma pessoa. Mas ainda que não se perceba ou que seja tomada em uma fração de segundos, fazemos uma escolha a cada vez que tomamos uma decisão, agimos, falamos, sentimos...
Meu marido costuma dizer, nas poucas vezes em que brigamos, que consegue ver nos meus olhos que eu luto contra um monstrinho que existe dentro de mim. Acho muito interessante essa observação. Confesso que a primeira vez que ouvi isso dele me magoei. Mas logo isso se tornou para mim um elogio. Eu tenho mesmo o monstro dentro de mim, o lobo “mau”, mas certamente, na maior parte das vezes, eu opto por alimentar apenas o lobo “bom”, e também deixo ele passear mais vezes... O lobo “mau” fica trancafiado, obediente, esperando a chance de mostrar os dentes, mas isso raramente acontece. E por que? Porque eu escolho o lobo bom. Eu escolho em vez de gritar, ponderar. Eu escolho em vez de odiar, relevar. E colocar em prática essa escolha não é fácil. Não é confortável. Não é instintivo. Algumas pessoas podem se orgulhar de serem equilibradas e ponderadas por natureza. Eu não. Eu tive que construir esse equilíbrio e ponderação com boas lições e muita prática. E talvez até por isso mesmo eu posso dizer que venci essa batalha, e que domestiquei meu lobo “mau”, e o tenho sob controle. Se ele nunca tivesse sido testado, se tivesse sido ignorado, talvez estivesse à espreita, à espera de uma oportunidade para saltar livre por ai. Mas não. Eu já vivenciei momentos em que se ele tivesse sido alimentado e estivesse livre da coleira estaria à solta por ai, mas pude perceber que ele não chegou a colocar a cara para fora.
Ao compartilhar a minha história quero fazer entender que mudar o comportamento e até mesmo o sentimento que temos em relação às coisas é sim uma questão de escolha e de disciplina. Não somos animais, vivendo na selva, com instinto de lutar ou fugir. Somos seres inteligentes, com muita força interna, e com muitas ferramentas disponíveis para fazer a escolha sobre a maneira como queremos nos comportar, encarar a vida e sentir em relação às coisas e pessoas.
Mas é preciso estar atento tanto para o aprendizado, as escolhas, os valores que temos e que queremos manter ou adquirir novos, e também ao momento em que somos chamados a decidir ou agir, se o faremos com base no “instinto”, ou se vamos optar por agir conscientemente, da forma como escolhemos como melhor para nós mesmos. É preciso aguçar a percepção, manter-se atento aos sinais, não se deixar levar pelo ambiente. Manter a inteligência emocional ativa, estar “sempre alerta”, pelo menos até que os novos comportamentos, pensamentos e sentimentos passem a ser tão naturais quanto os instintivos. Quando começamos a dirigir prestamos muita atenção aos pés no acelerador e na embreagem, até que, com o tempo, o movimento é natural, quase instintivo. Quanto mais dirigimos, mais isso fica natural. Quando compramos um carro automático e não usamos mais esse aprendizado, logo ele se deteriora, e teremos problemas para relembrar na hora da necessidade.
É exatamente assim que acontece quando buscamos a mudança de comportamento. Vamos escolher esse comportamento. Vamos aprender sobre ele. Ter consciência sobre essa escolha, e o momento em que ela será utilizada. Temos que praticar, muitas, inúmeras vezes antes de adquirir uma certa naturalidade. E vamos precisar estar constantemente atentos. Mas é possível e depende exclusivamente de nós mesmos.
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